Por Gabriel Felipe e Eduardo Sousa, estudantes de Medicina e do Coletivo "Quanto vale uma vida?"
No dia 18/09, o juiz federal José Carlos do Vale Madeira decidiu pela suspensão a adesão da UFMA à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalar (EBSERH), devido à irregularidade dessa adesão, que ocorreu sem passar pelos Conselhos de Administração (CONSAD) e Universitário (CONSUN). Mas o que é essa EBSERH? Por quais motivos se tentou fazer sua aprovação dessa forma?
A EBSERH é uma
empresa pública de direito privado criada pelo governo federal no final de 2010
com o objetivo administrar e gerir todos os hospitais universitários federais
do Brasil, desvinculando estes das universidades. Ela instalará uma lógica
produtivista dentro dos HUs, estabelecendo metas de desempenho, prazos e
indicadores. Ela terá capital próprio, poderá gerar lucro e obter recursos
através de prestação de serviços, alienação de bens das universidades,
aplicações financeiras, direitos patrimoniais (como aluguéis), empréstimos,
acordos e convênios com a iniciativa privada, além dos repasses tradicionais da
união. Ou seja, abertura dos HUs ao capital privado.
Como fica o ensino, pesquisa e extensão nesses Hospitais-Escola?
Sabemos que o tripé
ensino, pesquisa e extensão é a essência da universidade pública, e que estas
são atividades que demandam muitos investimentos. Porém isso entra em contradição com o modelo
adotado pela EBSERH.
Para a empresa,
investir em ensino, pesquisa e extensão não trará retorno financeiro direto,
dificultará os profissionais a cumprirem as metas estabelecidas, e representará
um grande gasto para o orçamento.
Como a falta de
verbas é uma das principais causas dos problemas dos HUs e não haverá aumento
do financiamento público, a empresa poderá prestar serviços, receber doações e
realizar convênios com a iniciativa privada, como saída para aumentar a
arrecadação dos HUs.
Isso já ocorre em
hospitais que adotam modelos semelhantes.
O HC (hospital das clínicas) da USP possui convênios com empresas como a
Dixtal Biomédica Ltda, Instituto Avon, Vale do Rio Doce e com a Fundação
Ford. O HC de Porto Alegre recebeu um
milhão de dólares como doação da Sanofi-Aventis.
Contudo, nenhuma empresa
faz doações se não há algum tipo de retorno para a própria. Portanto nos HUs,
essas relações promíscuas significam que as empresas utilizarão a estrutura e mão
de obra qualificada da universidade pública para benefício delas próprias. As consequências
dessas parcerias para a autonomia universitária são devastadoras. Como ficará a
independência nas pesquisas realizadas? Os HUs são responsáveis por grande
parte das pesquisas na área da saúde no Brasil, nos levando a pensar que tipo
de pesquisa será estimulada dentro desse novo ambiente criado. A partir da abertura a parcerias com a
iniciativa privada, a universidade tenderia a pesquisar apenas aquilo que fosse
objeto de interesse das empresas dispostas a investir, e não mais o que a população
e a saúde pública no Brasil de fato precisam ou o que os pesquisadores de fato
querem. E em se falando de áreas cuja pesquisa não irá gerar lucro, como
ficamos?
E como ficam os profissionais do Hospital?
A incoerência da
Lei que da EBSERH é tamanha que para “regularizar” a situação dos terceirizados
opta-se por impor a todos os profissionais contratados o mesmo regime
precarizante de trabalho que o TCU condenou. Esse é o regime CLT (consolidação
das leis trabalhistas), o mesmo tipo de contrato firmado por empresas privadas
com seus funcionários, que substituirá o RJU (regime jurídico único), contrato
dos servidores públicos concursadas.
Essa nova forma de contratação
diminui a estabilidade dos profissionais e aumenta significativamente a rotatividade
nos quadros dos HUs, já que os contratos serão temporários e os funcionários
contratados podem ser facilmente demitidos. Fragilizando a relação desses
profissionais com a instituição, algo fundamental para o atendimento e ensino
de qualidade. Além disso, poderá esses trabalhadores sugerir mudanças que, por exemplo,
vão contra a empresa e a favor do ensino de qualidade, se o risco de demissão é
eminente? Eles terão liberdade para se organizar
e reivindicar seus direitos? Trabalhar com a faca no pescoço definitivamente
não ajuda na boa prática de ensino. O mais grave de tudo isso é que, mais
prejudicado que os estudantes, ficará o próprio atendimento da população.
Quais os exemplos disso?
Na UnB, os
concursos prometidos com a adesão à empresa não foram realizados, vários
serviços exclusivos foram fechados e outros estão em iminência de fechar,
resultando em uma série de protestos e paralisação das aulas.
Na UFPI, segundo uma
auditoria do Ministério Público, a EBSERH e a Direção do Hospital Universitário
não estão honrando o contrato de prestação de serviços, não havendo a
implantação de serviços previstos, diversos setores e equipamentos estão
ociosos ou funcionando apenas parcialmente. Isso se deu apesar do repasse
mensal de R$ 2 milhões mensais, acumulando R$ 10 milhões nos 5 meses de
funcionamento, enquanto que os atendimentos do hospital só correspondem a R$
164.180,23 (1,64% do valor recebido). Além disso, em documento anexado a
auditoria, os profissionais denunciam a falta de estrutura, equipamento e a
sobrecarga de trabalho, devido à necessidade de cumprir metas de atendimentos e
realizar o ensino.
Mas e agora, o que podemos fazer?
Apesar de toda a
importância dessa empresa para a universidade e o HU, o reitor se negou a abrir
uma discussão com a comunidade acadêmica e de forma autoritária tentou aprovar
essa adesão. Contudo, a medida de suspensão do judiciário mudou o panorama e
abriu uma nova chance de resistência, sendo agora obrigatória a votação dessa
adesão nos Conselhos da Universidade.
Existe uma ampla
frente nacional contra a privatização do SUS que vem acumulando forças em todo
país, envolvendo docentes, estudantes, técnicos administrativos, profissionais
e entidades ligadas à saúde. No terreno jurídico, a FASUBRA, o ANDES-SN e a
FENASPS fizeram uma representação provocando a Procuradoria Geral da Republica
que, por sua vez, ajuizou uma ADIn – Ação Direta de Inconstitucionalidade
contra a EBSERH, na qual o CFM ingressou na condição de Amicus Curiae.
É o momento dos
estudantes se mobilizarem e decidirem qual o futuro para seu hospital
universitário. Não pertiremos mais nenhuma medida autoritária! Para isso
chamamos a todos para um debater mais aprofundado sobre a EBSERH na segunda,
dia 14/10, e para participar de todas as reuniões do CONSUN.
Eu Defendo o SUS, digo não à EBSERH!
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