“...Não aceiteis o que é de hábito como coisa natural,
Pois em tempo de desordem sangrenta,
De confusão organizada,
Pois em tempo de desordem sangrenta,
De confusão organizada,
De arbitrariedade consciente,
De humanidade desumanizada,
Nada deve parecer natural,
De humanidade desumanizada,
Nada deve parecer natural,
Nada deve parecer impossível de
mudar.”
Bertolt
Brecht
Através
desta declaração, a ANEL presta seu total e irrestrito apoio à greve dos
docentes das Instituições Federais de Ensino Superior. Pela justeza de suas
reivindicações e a força de sua mobilização, nos somamos às assembléias e
comandos de greve e convocamos todos os estudantes a também se levantar, em
defesa da educação pública, gratuita e de qualidade, e de uma expansão com 10%
do PIB para a educação. Essa luta é de todos nós, trabalhadores e estudantes
brasileiros.
A
força da greve é impressionante. Até o momento, já são 45 IFES que aprovaram parar,
sendo 41 universidades e 4 institutos. Além destas, há diversos informes de
assembléias que serão realizadas nos próximos dias para deliberar sobre a greve.
De acordo com Pires, 2º vice-presidente da Regional Rio Grande do Sul
do ANDES-SN: “Quem estava em dúvida se era oportuno entrar na greve, agora, devido à
força inicial, tem decidido pela paralisação”. De acordo com a nota oficial
do Comando Nacional de Greve: “são muitos os relatos de assembléias e atos públicos
considerados históricos pelo número de participantes, qualidade dos debates e entusiasmo.
A greve se mostra forte desde o início e o conjunto de informações indicam que
o movimento se ampliará ainda mais nos próximos dias.” Não é nenhum exagero
afirmar que este movimento grevista de 2012 deverá superar a histórica greve de
2001.
Veja as IFES que já
aprovaram a greve
Já estão em
greve: UFAM, UFPA, UFRA, UFOPA, UNIFAP, UNIR, UFRR,
UFAC, UFMA, UFPI, IFPI, UFPB, UFCG, UFAL, UFPE, UFRPE, UFS, UFERSA, IFC,
UNIVASF, UFMT, UFG campus catalão, UFGD, UFOP, CEFET/MG, CTU/JF, UFLA, UNIFAL, UFV,
UFU, UFVJM, UFSJ, UFTM, UFES, UNIPAMPA, FURG, UFPEL, UFPR, UTFPR.
Entra na segunda (21/05):
UFRB, UnB, UFJF, UniRio, UFRRJ.
Entra na terça (22/05):
UFF.
Entenda por que os professores entraram em
greve
Quando
um estudante se depara com a situação dos seus professores pararem as aulas
para fazer greve, muitas vezes a reação imediata é questionar, já que estaria
prejudicando as suas aulas. Contra essa reação, a ANEL alerta: a culpa de
estarmos sem aulas é do governo federal, e não dos professores em greve, e nas
próximas linhas explicitaremos o porquê.
Em
2011, no ano passado, após a forte greve da FASUBRA que durou mais de 100 dias,
o ANDES-SN fechou um acordo com o governo federal que incluía reestruturação da
carreira docente, valorização do piso e incorporação das gratificações, o que
ficou chamado de “Acordo 04/2011”. Como explicitava a ‘cláusula III’ do acordo,
“a representação governamental adotará as
providências necessárias para que os efeitos financeiros das medidas previstas
nesta cláusula sejam implementados em março de 2012”. Já estamos em maio e o
acordo foi descumprido.
Diante da
ameaça de greve, o governo apresentou no dia 14 de maio a Medida Provisória
568/12, que inclui parte do acordo firmado ano passado (reajuste de 4%) e mais
uma série de elementos bastante polêmicos. Sequer contempla a principal
reivindicação relativa à reestruturação da carreira docente. Fica claro que foi
uma jogada política para buscar desarticular a greve, mas os professores que
não são bobos nem nada, não caíram nessa.
A
MP 568/12 transforma os adicionais de insalubridade e periculosidade em valores
fixos, ao invés de serem por porcentagem (como funciona hoje). Além de ter
fixado os valores nivelando por baixo, retira a possibilidade de reajuste dos
adicionais, já que sendo fixos não poderiam sofrer alterações. Além disso,
reduz quase que pela metade o salário dos médicos dos Hospitais Universitários.
Como se não bastasse apresentar o projeto da EBSERH – Empresa Brasileira de
Serviços Hospitalares – para ser votado nos Conselhos Universitários, que
avança na privatização dos HUs, ainda diminui a valorização do trabalho dos
médicos. É preciso exigir ao governo que retire já essa MP e negocie com o
Comando de Greve, atendendo suas reivindicações. Até agora, o governo Dilma se
mostrou intransigente ao diálogo.
Para
os técnico-administrativos, de acordo com a FASUBRA, a pauta tem como
eixos fundamentais: aumento do piso salarial, solução das pendências na
carreira, reposicionamento dos aposentados, reajuste salarial de 22,08% (com reposição
da inflação de 2010 e 2011), data base dia 1º de maio, definição de uma
política salarial digna para os trabalhadores do serviço público.
Há,
no entanto, um elemento extremamente potencializador das revoltas entre os
docentes e técnico-administrativos, que não se traduz exatamente por essas reivindicações.
Nos últimos anos, acumulou-se uma condição cada vez mais precária de trabalho
nas universidades, e é impossível não identificar essa situação com o processo
de expansão desordenado e sem recursos promovido pelo governo federal através
do REUNI.
A expansão deve ter direito à qualidade!
Imagine
um balão de ar. Na medida em que você assopra mais, ele vai crescendo. Por conta
do limite da sua elasticidade, para seguir soprando e o fazer ficar ainda maior,
ou você compra outro, mais largo e com uma borracha mais resistente, ou
inevitavelmente ele vai estourar. A partir desta metáfora, é possível
compreender o que se passa nas universidades e institutos federais com um
processo de expansão que, nos últimos 5 anos, foi feito sem o aumento
necessário de verbas. É um absurdo que cerca de apenas 4% da juventude
brasileira tenha acesso às universidades públicas, portanto a expansão das
vagas é extremamente necessária. Para se fazer isso com qualidade, porém, é
necessário tratar com prioridade e investir os recursos necessários, e não foi
isso que o REUNI fez.
O
REUNI – Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das
Universidades Federais – o conhecido decreto 6096 instaurado pelo governo Lula
em 24 de abril de 2007, buscava impor centralmente duas metas para as
universidades federais, que propunham quase dobrar o número de alunos pro
professor e praticamente atingir a aprovação automática, contidas em seu artigo
1º:
“§ 1o O Programa tem como meta global a elevação
gradual da taxa de conclusão média dos
cursos de graduação presenciais para noventa por cento e da relação de alunos de graduação em cursos
presenciais por professor para dezoito, ao final de cinco anos, a contar do
início de cada plano.”
Para
atingir as metas, o decreto apontava, entre outras questões, uma “revisão
da estrutura acadêmica” e a “diversificação das modalidades de
graduação” (artigo 2º, diretrizes III e IV). Tratava-se da
reestruturação completa dos currículos, da abertura de novos cursos de
graduação com carga horária e determinação profissional mais enxuta e flexível,
além de avançar para a construção dos chamados “Bacharelados
Interdisciplinares”.
O
REUNI promoveu um aligeiramento dos currículos e um processo crescente de
substituição dos cursos profissionalizantes ou criação de novos “tecnólogos”,
com a simplificação das graduações. Ou seja, a universidade pública perde a
qualidade no ensino que apesar de todas as desigualdades ainda conseguia
resistir e passa por uma metamorfose para transformar-se em um grande “escolão
de 3º grau”. O governo federal trabalhou com números e estatísticas, e não
estudantes que seriam futuros profissionais de qualidade, e assim tenta nos
impor uma formação barata para cumprir papel de mão-de-obra de baixa
qualificação e ocupar postos de trabalho precarizados.
Para
viabilizar a implementação do projeto financeiramente, as universidades
federais receberiam um “incentivo”, expresso no artigo 3º do decreto:
“§ 1o O acréscimo de recursos referido no inciso III será limitado a vinte por cento das
despesas de custeio e pessoal da universidade, no período de cinco anos de que trata o art. 1o, § 1o.”
O decreto
apontava ainda, no mesmo artigo, que a expansão deveria garantir:
“I - construção e readequação de infra-estrutura e
equipamentos necessárias à realização dos objetivos do Programa;
II - compra de bens e serviços necessários ao funcionamento
dos novos regimes acadêmicos; e
III - despesas de custeio e pessoal associadas à expansão das
atividades decorrentes do plano de reestruturação.”
Os cinco anos
que aborda o decreto passaram, e agora temos o dever de questionar:
As universidades federais que viveram o REUNI receberam o investimento
necessário?
Os três pontos acima relatados no decreto foram respeitados pelo
governo federal?
Foi preservado o tripé ensino-pesquisa-extensão?
Em base a que condições de trabalho para professores e funcionários o
projeto foi implementado?
Foi garantida a assistência estudantil necessária para a permanência na
universidade?
Foi garantido o caráter público e gratuito sem avançar as parcerias
público-privadas?
Qual a situação que encontramos atualmente em cada universidade,
passada a experiência da expansão e da reestruturação acadêmica?
Há cinco anos,
os estudantes lutaram, ocuparam reitorias em todo o país, dizendo que não
bastava expandir, mas que era preciso fazer isso sobre outra lógica e com mais
investimentos. Hoje, os problemas que foram alertados há 5 anos atrás se
tornaram realidade. Acreditamos que a atual greve é a resposta mais contundente
a todas essas perguntas: sem condições mínimas que subsidiassem uma expansão
com qualidade, o balão estorou.
A difícil realidade das
universidades federais e da educação pública brasileira
Só
nos últimos 2 anos, governo Dilma cortou quase R$5 bilhões da educação, e ao
mesmo tempo, apresentou o novo Plano Nacional da Educação. Este Plano, além de
aprofundar as medidas de transferência da verba pública para o setor privado e
avançar na precarização da educação, não resolve o problema fundamental que
vivem as universidades e escolas: a falta de financiamento. Propõe na meta 20
do PNE o aumento para 7% do PIB em educação, a ser atingido só em 2020! E pra piorar,
incorpora através da meta 12 do PNE as metas do REUNI, transformando-as em
política de estado e estendendo a todos os níveis de educação e também às
instituições estaduais e particulares. Se a situação já estava feia, se
depender do governo pode ficar ainda pior nos próximos anos.
Se
levarmos em conta ainda a situação da escola e creches públicas, tanto as
federais, estaduais e municipais, vemos que o problema começa desde a base. Os professores
sequer têm direito ao piso nacional salarial, e pelos miseráveis salários que
recebem tem que pegar mais de uma matrícula e uma grande sobrecarga de
trabalho, para conseguirem manter suas famílias. A falta das condições básicas
de trabalho, muitas vezes sem carteiras suficientes nas salas, ou giz nos quadros
negros, e ainda a pouquíssima assistência estudantil deixa claro a situação de
precarização. Não é a toa que o Brasil está colocado nos piores índices
educacionais no mundo, o que entra em choque com a posição de 6ª maior economia
do mundo. A quem está a serviço este crescimento econômico, se não está para o
povo?
Atualmente, a
realidade de um estudante, professor ou funcionário de uma universidade federal
não é muito diferente, e nos deparamos com inúmeros problemas cotidianos. Seguem
alguns listados abaixo.
Entre os problemas envolvendo a assistência estudantil:
- Restaurantes Universitários que
não comportam a demanda e fazer surgir filas cada vez maiores.
- Moradias que passam longe de
comportar a demanda e muitos abandonam os estudos por morar muito longe e pela
impossibilidade de pagar um aluguel num local mais próximo, ainda mais com a
especulação imobiliária crescente que atinge muitas capitais.
- Bolsas insuficientes e sem
reajuste, que sequer dão conta dos gastos mais básicos (xerox, transporte, alimentação).
- Falta de creches universitárias
para mães estudantes, que acabam por atrasar muito ou abandonar sua formação
universitária.
Entre os problemas acadêmicos:
- Salas de aula super-lotadas.
- Enorme falta de professores,
com muitas disciplinas que passam o semestre todo nessa condição.
- Aumento dos professores
temporários ou substitutos em detrimento dos efetivos de dedicação
profissional.
- Aumento de até 40% das
horas-aula para os professores, diretamente ligado à redução de projetos e
bolsas de pesquisa e extensão.
- Laboratórios científicos e de
informática sem equipamentos suficientes ou qualquer renovação que busque a
atualização tecnológica.
- Bibliotecas defasadas, com
livros mal conservados e poucas unidades que dêem conta da demanda.
Entre os problemas de infra-estrutura e segurança:
- Obras não finalizadas, e a conseqüente
falta de prédios e salas de aula que comportem a parte acadêmica e administrativa
dos cursos novos, especialmente nos campi
do interior.
- Má conservação dos prédios e
laboratórios, que geram incêndios, queda de parte da estrutura, mofo,
insalubridade.
- Falta de bebedouros.
- Falta de condições mínimas de
higiene nos banheiros e pouca quantidade para suportar a demanda.
- Falta de segurança nos campi,
pela pouca iluminação e lugares desertos, sem guardas universitários, o que é o
responsável muitas vezes pelos casos de estupro às mulheres estudantes.
- Falta de adaptação dos prédios
para garantir a acessibilidades aos estudantes que necessitarem.
É
um absurdo que o governo Dilma deixe a educação pública brasileira sob essas
condições. Elegeu-se com a confiança dos brasileiros de que a educação seria
uma prioridade em seu governo, e o que dá em troca é isso? A única forma de
resolver esse problema é através da luta, das mobilizações, protestos de rua,
ocupações de reitoria e greves. Ao longo da história do nosso país, só
conseguimos avançar em direitos e soluções aos problemas sociais com muita
luta! Em 2012, também não será diferente.
Espelhados na
juventude árabe, européia e chilena, é hora da juventude brasileira entrar em
ação!
Neste
movimento grevista que se iniciou com a paralisação dos docentes, a resposta
dos estudantes têm sido muito positiva. Tanto pela solidariedade aos nossos
mestres, quanto pelas nossas próprias reivindicações, os estudantes têm
organizado grandes assembléias, aulas públicas, protestos de rua e inclusive,
aprovado greve estudantil. Já são pelo menos 16 IFES, entre universidades e
institutos, que já decretaram greve estudantil geral ou alguns cursos. E esse
número, na medida que a luta avança, tende a aumentar rapidamente.
Aqui
é preciso fazer uma reflexão. Estamos diante de uma luta de proporções enormes,
que com certeza entrará pra história do nosso país. A entidade responsável em
articular e desenvolver lutas estudantis deste porte ao longo da história do Brasil
foi a União Nacional dos Estudantes. Porém, atualmente, a UNE será capaz de
cumprir esse papel? Nós afirmamos categoricamente que não.
A
UNE de hoje em dia está completamente vendida para o governo federal. Não é a
toa que apóia este novo PNE, que se calou diante dos cortes para educação e
perdeu completamente a independência, política e financeira, diante do governo
e reitorias pelo país. Agora, neste momento de greve, não aparecem nas
assembléias e ignoram a forte luta estudantil que está se gestando, publicando
uma breve nota em seu site que apenas faz menção à greve docente e sequer
explicita suas verdadeiras razões, preservando o governo. Está claro que para
desenvolver e potencializar esse processo, levando-o a uma vitória, não
poderemos contar com a UNE. Pelo contrário, iremos até em alguns casos nos
enfrentar contra ela no calor das lutas, assim como foi em 2007.
Apesar
disso, é extremamente fundamental que os diferentes DCEs, Executivas de Curso,
Centros e Diretórios Acadêmicos e Grêmios, tenham uma articulação nacional. Nós
da ANEL estamos fazendo desde já essa batalha. Em cada universidade e escola, intervindo
nas assembléias, atos e comandos de greve, buscamos a unificação nacional deste
processo, política e organizativamente. Desde já, convidamos todos os lutadores
para a nossa VI Assembléia Nacional, que deverá ser um desaguadouro natural de
todo o processo de mobilização, reunindo centenas de estudantes no dia 16 de
junho, no Rio de Janeiro. É em momentos de luta nacional como esse que fica
ainda mais evidente, por um lado, a falência da UNE, e por outro, a necessidade
de uma entidade nacional dos estudantes. A ANEL tem intervido nesse sentido
desde junho de 2009, e chamado à unidade o movimento estudantil independente.
Pela construção do
Comando Nacional de Greve dos Estudantes!
Agora, mais ainda,
é preciso unificar nacionalmente o conjunto do movimento estudantil. É nesse sentido que a
ANEL tomou a iniciativa de lançar o “MANIFESTO DO MOVIMENTO ESTUDANTIL
BRASILEIRO”, para que seja assinado pelos diversos DCEs e entidades estudantis
do país. Este Manifesto, além de prestar todo o apoio à greve da educação,
convoca todos e todas à Marcha Nacional pela Educação no dia 5 de junho, que já
está sendo convocada pela FASUBRA e pelo ANDES-SN, e a instalação nesta mesma
data do COMANDO NACIONAL DE GREVE DOS ESTUDANTES. Com a presença das principais
entidades estudantis, este Comando deve ser nosso principal instrumento para
articular, organizar e potencializar a mobilização dos estudantes.
Enquanto
assistimos ansiosos o desenrolar das revoluções e lutas no Norte da África,
Oriente Médio, Europa, Chile, EUA, Canadá, começamos a desenvolver o que pode
vir a ser a explosão da juventude brasileira. Em meio a uma crise econômica
mundial, que trará profundas transformações ao mundo que vivemos, nós, com a
força do movimento estudantil brasileiro, podemos interferir na mudança do Brasil
e do Mundo. Parece utópico? Uma greve com quase 50 instituições federais
paradas também parecia, há poucos dias atrás.
A ANEL chama
todos os estudantes brasileiros à luta: tomemos o leme em nossas mãos e vamos
às ruas fazer história! Como diziam os estudantes em maio de 68: sejamos
realistas, façamos o impossível!
Saudações Estudantis!
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